Não
importa como. Navegar é preciso. Utilizando, inclusive, recursos
naturais, como fez a ave das fotos, um socó, velho habitante do Rio
Aririú.
Quero
contar, que ainda lembro muito bem da navegação, em meados dos anos
1950. Canoas de garapivu, bateiras montadas com madeira e pregos de
cobre, calafetadas com alcatrão, batelões e os saudosos botes à
vela.
Uma
verga de bambu, um remo artesanal, uma vela aos ventos, tudo isso
era utilizado para impulsionar essa navegação rudimentar, mas muito
eficiente.
Meu
avô paterno, da tribo Espíndola, usava canoas e lanchas, na
pescaria de tainhas, anchovas e outras espécies marítimas. Claro
que também pescava camarão, tanhotas e parati, no Rio Aririú e no
Rio Cubatão.
Já
o avô materno, Zé Manduca, da tribo Alves, pescava muito pouco. Se
ocupava bem mais com as roças de mandioca, aipim, milho, feijão.
Cuidava do gado, e fazia farinha no engenho.
Mas,
também exercia a atividade paralela de “pombeiro” – até hoje
não entendo o porquê do nome, pois não negociava com pombos.
Porém, sabe-se que pombeiro é um comerciante ambulante que compra e
vende de tudo um pouco. É um personagem folclórico dos Açores e do
litoral catarinense.
Zé
Manduca comprava e vendia, sim, galinhas, ovos, verduras, frutas,
charque, açúcar mascavo, lenha. Comprava dos vizinhos, ia longe
recolher as mercadorias, e revendia no Mercado Público, em
Florianópolis.
O
transporte, para entregar essas mercadorias aos clientes, na Ilha,
utilizava o sistema aquaviário, ou hidroviário. Esse é o ponto
dessa conversação. O velho Zé Manduca usava um bote à vela como
meio de transporte.
Duas
ou três vezes por semana, o bote de velas brancas partia do “porto”,
na Vila Nova, bem cedinho, antes do sol nascer. Navegava pelo Rio
Aririú até alcançar a Baía Sul. Costumava retornar, do Mercado
Público, sempre no comecinho da tarde, trazendo querosene,
ferramentas, cordas, sal, açúcar refinado. Para consumo próprio e
para revender.
Fui
caroneiro do bote de peroba, algumas vezes. Lembro ainda, da minha
satisfação de menino, vendo o sol nascendo, avermelhado, enorme,
por cima das águas, que batiam crespas no casco do barco.
Ainda
lembro... Costumava passar a noite acordado, espreitando, com os
ouvidos atentos a qualquer ruido, os olhos arregalados, caçando a
primeira luz da lamparina. A luz e o galo, que cantava para anunciar
o dia, me convenciam a pular da cama. Mesmo numa madrugada fria. É
que o Vô Manduca estava preparando o bote para partir.
Estou,
apenas, pretendendo dizer que navegar é preciso. Que é possível
navegar. Que o transporte marítimo, interligando Palhoça, São
José, Florianópolis e Biguaçu, é uma excelente alternativa, para
amenizar os problemas decorrentes da falta de mobilidade urbana.
A
ave das fotos, um socó pousado sobre uma jangadinha improvisada, um “bote”
de entulhos, está indicando o caminho da navegação. Navegar é
preciso. É possível navegar.
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Fotos: Baby Espíndola Repórter