O aniversariante não foi convidado para o banquete da
noite de Natal.
Está acontecendo tudo novamente, como manda o figurino. A
ceia está quase pronta, a casa recebeu retoques de higiene e estética,
resultado de uma arrumação, que só acontece em datas especiais – muito especiais.
Os parentes estão reunidos. As visitas estão chegando. Os
mais antigos desfilam as conquistas do ano: o carro novo, o apartamento, compras
e mais compras, falam da última separação como fato corriqueiro e se entregam
ao álcool, como divino salvador de todos os problemas.
Alheias a essas questões, as crianças silenciam, grudadas
nos eletrônicos e conectadas na rede – Ah, que saudade das crianças
barulhentas, que corriam, pulavam e, inclusive, falavam e sorriam.
A festa está quase completa. Só não está perfeita porque
o Papai Noel ainda não chegou. Mas, vai aparecer logo, logo, com seu traje
sufocante, apropriado para o Pólo Norte, onde o Natal é comemorado sob um frio
intenso e muita neve.
Pois é, está acontecendo tudo novamente, como manda o
figurino. Já foi assim no ano passado, e nos outros também. Muitos se envolvem com
compras em exagero, até o endividamento – e os bancos adoram!
Nenhum espaço para a reflexão, para o Espírito operar o
milagre da fé em sua essência. Que seria o verdadeiro significado do Natal.
Olhos e ouvidos estão sintonizados na porta, por onde
deverá entrar um Papai Noel suarento, certamente com o desodorante vencido.
Mais uns minutos de ansiosa espera e finalmente, sob um
foguetório capaz de assustar até as corujas, o velhinho do Pólo Norte chegou à
casa em festa, no Pólo Sul.
Exatamente, como manda o figurino, está acontecendo tudo
novamente. Agora a festança parece completa.
Parece. Mas, não está. Lá fora, um homem alto e magro
geme na escuridão. As lágrimas inundam seu rosto. As chagas estão abertas,
revelando a dor imensa. Carros apressados passam por ele. Pessoas, a caminho de
festas e em princípio de viagem mal notam sua presença. Breves olhares de
indiferença o abandonam à própria sorte, como um mendigo.
No interior da casa, a festa chega ao seu auge. É hora de
abrir presentes e trocar gentilezas, geralmente pronunciadas sem o menor
carinho. O Papai Noel senta-se, confortavelmente, em seu trono de reinado. Tudo
gira em torno dele.
Lá fora, o homem sofre, pela dor do abandono. E chora
silencioso, na escuridão. Apesar de não ser lembrado, abençoa a todos e, se
preciso for, dará novamente a vida para salvar a humanidade insensível e
materialista.
Que tristeza. Está acontecendo tudo novamente. O dono da
festa, o aniversariante, foi esquecido, não foi convidado para o banquete da noite
de Natal.
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