quarta-feira, novembro 11, 2009

Editorial - A EDUCAÇÃO ABAIXO DA LINHA DA CINTURA

Os brasileiros insistem na triste mania de debater amenidades, fatos supérfluos, talvez como forma de fugir das questões mais complexas, que estão a exigir solução imediata. Temas prioritários são relegados a segundo plano, pela sociedade civil, comprovadamente muito menos organizada que o crime desorganizado. Ressaltemos que tudo isso é muito conveniente às autoridades que ocupam os poleiros do poder.

Mas, quando a mídia eletrônica descobre um esteriótipo, um escândalo, os debates se alastram Brasil a fora. O tema, nem sempre importante, passa a dominar as conversas nas esquinas, alastra-se pelos milhões de metros lineares dos balcões de bares, botecos e similares, invade os campos, claro, sempre ganhando uma versão espalhafatosa.

Assim foi com o caso da falsa professora, que rebolou o rabo pomposo, num bailão de periferia, e virou celebridade. Todos os debates relativos à educação foram imediatamente suspensos. Só a bunda – diria, pib: produto interno bruto, bruto mas muito macio – abundou nos debates, por um longo período. Diariamente, a televisão mostrava o rabão da “educadora”, que foi guinchada pela calcinha, pelo braço forte de um malandro qualquer.

Na mesma época, tentaram linchar uma professora, no Rio Grande do Sul, simplesmente porque ela mandou um aluno, desordeiro e mal educado, pintar a parede da escola que ele, deliberadamente, riscou e emporcalhou.

Agora, o tema é outro. Mas também tem a ver com rabo-cultural, com educação abaixo da linha da cintura. Desde que uma estudante, do tipo chester, só peitos e coxas, quase foi linchada, numa faculdade de São Paulo, porque seus panos estavam muito encolhidos, não se fala em outra coisa. A reforma da educação, a melhoria no ensino, todos os temas foram substituídos.

Que a loira, de contornos exuberantes, ousou demasiadamente nos trajes curtos, não há nenhuma dúvida. Mas, no país onde as pernas são ferramentas de trabalho, a punição, imposta pelos próprios estudantes, foi um exagero. Para deixar o prédio da faculdade, a jovem precisou da proteção de um esquadrão da PM de São Paulo. Pior, ainda, foi a decisão da direção da faculdade, que, num primeiro momento, expulsou a estudante.

Seus carrascos, mais pareciam fundamentalistas fanáticos, simpatizantes da execução sumária de mulheres, a pedradas, à moda bíblica. A turba era composta, principalmente, por estudantes alcoólatras, drogados, rapazes que não gostam de mulher e que fazem sexo em marcha à ré, além das garotas mal amadas, que trajam panos imundos e vulgares, ou que preferem o rola-rola com as colegas do mesmo sexo.

O grave de tudo isso, é que assuntos fundamentais deixam de ser discutidos. Por exemplo: o alcoolismo entre estudantes secundaristas e universitários, o elevado consumo de drogas ilícitas, a duvidosa qualidade do ensino, a exploração dos próprios universitários, que pagam valores exorbitantes para freqüentar as salas de universidades privadas.

Conclusão: é bem mais conveniente, e também divertido, discutir as variantes da educação abaixo da linha da cintura. Uma falsa professora guinchada pela calcinha, ou uma vistosa estudante com uma saia curta, são imagens muito mais tentadoras, o que significa excelente audiência para as emissoras de televisão.

Há que se concluir que as autoridades semi-analfabetas agradecem, pela ausência de discussão dos temas mais sérios.